A vacina tem como objetivo estimular o
sistema imunológico e criar anticorpos contra a nicotina, de acordo com a
diretora médica de vacinas da América Latina e Canadá da Pfizer,
Jéssica Presa.
— A ideia é que esses anticorpos
“grudem” na nicotina e, como se tornarão uma única molécula “grande”,
não conseguirão ultrapassar a barreira hematoencefálica [cerebral].
Assim, a nicotina não chegará ao cérebro e a pessoa não irá obter a
sensação de prazer com o cigarro.
Uma das 7.000 substâncias inaladas pelo
fumante em uma tragada, a nicotina que provoca dependência e sensação de
prazer, conforme explica a cardiologista Jaqueline Issa, diretora do
Programa de Tratamento do Tabagismo do Incor (Hospital das Clínicas da
Universidade de São Paulo).
— Nós temos vários receptores espalhados
pelo corpo e cérebro e a nicotina tem afinidade com eles. Na área do
cérebro responsável pelo prazer, há uma grande concentração. Quando o
indivíduo fuma, a nicotina entra nesse circuito, ocupa o espaço e a
sensação de prazer é amplificada. Em situações adversas, como estresse e
ansiedade, por exemplo, a pessoa fuma para atenuar sensações
desagradáveis. Então, ela aprende a usar o cigarro no prazer e na dor.
Por isso, há legiões de fumantes, pois entre 7 a 10 segundos a pessoa já
sente prazer.
Além de ajudar na possibilidade de
reduzir ou eliminar o vício do cigarro, novas doses da vacina fariam o
corpo continuar produzindo mais anticorpos por conta própria, e isso
contribuiria para impedir recaídas. De acordo com a diretora da Pfizer, a
vacina seria destinada a pessoas que são viciadas no tabaco e têm o
desejo de parar de fumar.
Na opinião da cardiologista do Incor, a imunização “seria mais atrativa no aspecto preventivo do que como tratamento”.
— Na medida em que a vacina faz um
bloqueio da nicotina, a pessoa passa pelo processo de abstinência, que
provoca sintomas como irritabilidade, falta de concentração, fome
excessiva e ansiedade. Essa situação poderia ser tratada de outra forma,
com medicação por exemplo. Então, a princípio, o ideal seria vacinar
pacientes que já pararam de fumar para evitar a recaída, já que mais de
50% das pessoas que param de fumar acabam voltando. E também grupos de
riscos, como filhos de fumantes e pessoas de classes sociais mais
baixas, para que não caiam no vício.
A Pfizer informou que o estudo clínico
da vacina antitabaco está em estágios iniciais (fase 1) e deverá ser
concluído em dezembro desse ano. Nessa etapa, são avaliadas a segurança,
a tolerabilidade, a imunogenicidade (capacidade de dar resposta
imunológica) e mensuração de dose em adultos.
Vacinas para doenças não infecciosas
Essa não é a primeira vez que um
laboratório tenta fabricar uma fórmula contra o vício do cigarro.
Jaqueline explica que outros estudos não foram para frente, “pois os
anticorpos não tinham durabilidade suficiente”.
— Os pacientes então teriam que ser
revacinados com frequência e isso seria inviável até mesmo
financeiramente. Desde 2006 fala-se em método terapêutico contra o vício
no tabaco. Esperamos que a nova pesquisa consiga reverter esse problema
técnico.
Atualmente, não há nenhuma vacina que
reduza ou elimine o vício em cigarro. Mas, na visão do infectologista e
vice-presidente da SBIm (Sociedade Brasileira de Imunizações), Renato
Kfouri, a ciência avançou muito no conhecimento sobre agentes
infecciosos, suas formas de reprodução e os hospedeiros. Agora, o grande
desafio é conhecer melhor o desenvolvimento molecular para controlar as
doenças não infecciosas.
— Quando falamos em genoma humano, é
algo de grande complexidade. É necessário conhecer os marcadores de quem
vai ter obesidade, câncer e até dependências de drogas e álcool. Muitas
dessas doenças não são exclusivamente cromossômicas, já que também se
consideram os fatores ambientais, mas conhecendo seus mecanismos será
possível se antecipar e assim prevenir. O desenvolvimento de vacinas
para doenças não infecciosas é questão de tempo.
Segundo Kfouri, a ciência está evoluindo
a passos largos e, em alguns anos, será possível imunizar as pessoas
também contra doenças não infecciosas.
— Estamos caminhando nesse sentido, não
apenas contra o tabaco, mas contra obesidade e até mesmo o câncer.
Acredito que daqui alguns anos poderemos ter novidades em termos de
aplicação prática.
R7
Nenhum comentário:
Postar um comentário