O juiz Bruno Montenegro Ribeiro Dantas, em processo da 3ª Vara da
Fazenda Pública de Natal, reconheceu a obrigação do Município de Natal e
do Estado do Rio Grande do Norte de garantir o direito de todos os
cidadãos à livre circulação pelas vias públicas da cidade de Natal,
“devendo ser encampadas todas as medidas que se afigurem necessárias
para que as vias públicas estejam em condições de permitir o trânsito de
pessoas e veículos em total segurança, em detrimento de manifestações
realizadas ao arrepio dos parâmetros constitucionais, a saber, sem
prévio aviso à autoridade competente e/ou com o tolhimento desarrazoado e
irrestrito ao direito de ir e vir da população em geral, alheia ao
evento”.
A sentença se deu em Ação Civil Pública ajuizada pelo Ministério
Público Estadual contra o Município de Natal, o Estado do Rio Grande do
Norte e o Sindicato dos Proprietários de Transportes Alternativos no Rio
Grande do Norte (Sitoparn), em razão de manifestação realizada pelo
sindicato no dia 4 de dezembro de 2013, quando permissionários
bloquearam as principais vias da cidade com seus veículos durante quatro
horas e meia, ocasionando inúmeros transtornos à população.
Em sua sentença, o juiz Bruno Montenegro considera que apesar da
petição inicial referir-se a uma manifestação específica já ocorrida não
há nenhum obstáculo para o julgamento do processo, “considerando que o
objeto jurídico revolve um objeto mais amplo, consistente na garantia de
direitos fundamentais assegurados constitucionalmente, de modo que as
medidas que eventualmente venham a ser adotadas nestes autos irradiam os
seus efeitos a situações da mesma natureza que venham a se desenrolar
no futuro”.
Assim, o magistrado determina que o Município de Natal e o Estado do
RN devem promover todas as providências administrativas acautelatórias e
repressivas, se necessário for, para garantir o fluxo regular de
pessoas e automóveis, com auxílio, inclusive, da Polícia Militar.
Também no dispositivo da sentença, o juiz Bruno Montenegro determina
que a Polícia Militar fica obrigada a proceder com a prestação de
auxílio imediato à Secretaria Municipal de Trânsito em qualquer situação
de obstrução de vias públicas que possam trazer risco de danos a um
número indeterminado de pessoas, auxiliando o órgão público municipal a
desobstruir as vias públicas e restabelecer a livre circulação de
veículos e pessoas nos locais respectivos.
Especificamente ao Sintoparn, o magistrado determina a proibição para
que o sindicato utilize seus veículos para a realização de bloqueios de
vias públicas em qualquer e eventual tipo de protesto, bem como ocupe
prédios públicos de forma a impedir o funcionamento do serviço público
sob pena de suspensão total de suas atividades. A Secretaria Municipal
de Trânsito fica obrigada a tomar imediatamente providências
administrativas para restabelecer o fluxo de veículos pelas vias
públicas urbanas em qualquer situação na qual estes veículos estejam
impedindo o trânsito regular de pessoas e veículos, utilizando guinchos
para a retirada de quaisquer entraves à livre circulação de carros e
pedestres.
Decisão
Ao analisar a Ação Civil Pública, o juiz Bruno Montenegro entendeu
que o Sintoparn extrapolou os limites de seus direitos de reunião e de
manifestação do pensamento e ressaltou que não se pode emprestar a
qualquer direito ou garantia um caráter absoluto. O magistrado afirma
ainda que a liberdade de pensamento garantida pela Constituição Federal
não ampara práticas ilícitas e que atentem contra as demais liberdades
das pessoas.
Em outro trecho de sua fundamentação, o julgador entende que a partir
dessas premissas, “manifestações desta ordem, como àquela levada a
efeito pelo Sitoparn, mediante bloqueio de vias públicas e ocupação de
prédios públicos, de modo a impedir o tráfego regular de veículos e
causar a paralisação de serviços prestados à população, extrapolam os
critérios de razoabilidade e proporcionalidade”. Para o juiz, essas
práticas alçam os direitos de reunião e de manifestação de um pequeno
grupo a um patamar inexistente, suprimindo o direito de ir e vir
titularizado por todos os demais cidadãos, os quais, no mais das vezes,
se prejudicam em diversas searas de suas vidas, em razão de abusos dessa
natureza.
“Corroborar com esse tipo de excesso é chancelar que determinada
pretensão de alguns poucos possa transcender e arrefecer os direitos de
toda uma coletividade, em nome de uma compreensão ampliada e distorcida
do direito de manifestação. Não foi essa, me parece, a intenção do
legislador constituinte. Ora, o Estado Democrático de Direito jamais
pode ser conspurcado por determinados grupos ou segmentos da sociedade,
devendo os cidadãos e o Estado adotarem medidas efetivas na busca da
manutenção da ordem jurídica”, destaca trecho da sentença.
Bruno Montenegro considera que as manifestações em vias públicas são e
continuarão sendo mecanismos para o exercício da cidadania,
destacando-se como meio de expressão de ideias ou, com ainda maior
intensidade, de reivindicações e de protestos. “Todavia, não se pode
ignorar a necessidade de atendimento aos diversos regramentos legais
para a escorreita fruição do referido direito, o qual não pode assumir
ares de embaraço irrazoável e desmedido, consistindo em deturpação do
uso das vias públicas”.
(Processo nº 0802819-51.2014.8.20.0001)
TJRN
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