Os últimos balanços de Vasco e Fluminense são cruéis.
Mostram que em São Januário as dívidas chegam a R$ 450 milhões.
Nas Laranjeiras, mais de R$ 415 milhões.
Mesmo assim, há uma prática absurda.
E que sangra ainda mais os cofres.
Em todas as partidas do ano é a mesma coisa.
Os dois clubes subsidiam ingressos paras suas organizadas.
Ajudam financeiramente nas viagens.
Estão endividados, mas perdem dinheiro com os torcedores.
A paixão não é tão grande que possam bancar do próprio bolso ingressos e viagens.
Mesmo sabendo o estado de penúria dos clubes que amam.
Há um profundo relacionamento com a cúpula das torcidas.
Chefes frequentam os clubes, conversam com os dirigentes, pressionam jogadores.
A intimidade é total.
Há cumplicidade.
Dinamite e Siemsen se defendem dizendo que a ligação já é antiga, de décadas.
E não há como cortar esse elo.
Na verdade os dirigentes se comportam como reféns.
Não têm autonomia para romper.
Têm medo de represálias.
Isso não só acontece nestes dois clubes.
Mas em todo o Brasil.
Em São Paulo, o Ministério Público tentou agir.
Fez uma reunião com os presidentes dos quatro grandes.
Queriam que assinassem um acordo público.
Iriam se comprometer a não ajudar as organizadas.
De jeito algum.
Eles não aceitaram.
Ou seja, vão continuar sim ajudando os torcedores.
Atualmente, o Palmeiras está rompido com as suas torcidas.
Desde que membros da Mancha Verde tentaram bater em Valdivia na Libertadores.
Mas há um movimento de aproximação.
Em vários clubes do Brasil, as organizadas usam suas dependências.
Guardam materiais ou até mesmo têm salas especialmente reservadas a elas.
Gustavo Henrique jogador da base do Náutico passou por um enorme vexame.
Religioso, ele estava indo para um culto evangélico com outros jogadores.
Vestia uma camisa cor de rosa.
Associaram a cor à falta de masculinidade.
Torcedores que estavam na sala da organizada no clube não gostaram.
Passaram a xingá-lo e um deles jogou uma cadeira nas suas costas.
A agressão foi divulgada e nada aconteceu.
A torcida continua usando as dependências do clube.
E o jogador pede para todos esquecerem o que aconteceu.
As organizadas no Brasil têm um poder inacreditável.
O Corinthians mobilizou vereadores, deputados, ministros, embaixadores.
E, dizem, até o ex-presidente Lula.
Para soltar os 12 corintianos detidos em Oruro pela morte de Kevin Spada Beltrán.
O garoto de 14 anos foi morto por um sinalizador na Libertadores.
A torcida apresentou um menor como o autor do disparo.
Nada aconteceu a ele.
Todos que estavam detidos foram liberador na Bolívia.
Alguns deles voltaram a aprontar.
Brigando em estádios ou foram presos no Brasil.
Um deles foi acusado de roubo, tentou fugir da polícia.
Tomou tiros e está preso na Bahia.
Ninguém foi punido pela morte de Kevin.
O ministro Aldo Rebelo está sendo cobrado.
A imagem do Brasil foi mais uma vez comprometida.
A briga de ontem entre vascaínos e atleticanos foi deplorável em Joinville.
Membros de organizadas dos dois clubes se envolveram em um confronto selvagem, absurdo.
As cenas de torcedores chutando, pisoteando cabeças de rivais circulam pelo mundo.
As autoridades do país da Copa são mostradas como omissas.
E incentivadores desse mar de impunidade.
Pressionado, Rebelo distribuiu uma nota ontem.
"O Ministério do Esporte condena a violência que tomou conta das arquibancadas da Arena Joinville, em Santa Catarina, durante o primeiro tempo do jogo entre Atlético-PR e Vasco da Gama. Os responsáveis devem ser identificados e punidos, cumprindo-se o Estatuto do Torcedor, que prevê penas de reclusão e de banimento dos estádios aos torcedores que cometerem atos de violência."
Mas ele sabe muito bem.
Estádios passaram a ser territórios sem lei.
Agressões são consideradas banais.
Policiais de todo o Brasil querem ganhar dinheiro extra para trabalhar.
Alegam que são eventos privados.
Por isso em Joinville uma empresa de segurança foi contratada.
E a primeira coisa que os seguranças fizeram quando começou a briga foi se afastar.
Deixaram os vândalos tentarem se matar diante das câmeras.
O STJD promete.
Vai no seu limite.
Deve dar dez perdas de mando para o Atlético e Vasco em 2014.
E vai alterar a legislação esportiva.
Quer tornar possível jogos com estádios sem torcedores como punição.
Os dirigentes se mostram contrários e pressionam por anos a CBF para que isso não acontecesse.
Não querem perder dinheiro com os portões fechados.
O presidente José Maria Marin estava do lado dos clubes.
Mas diante da pressão da opinião pública vai ceder.
Só que o que ninguém tem coragem de verdade é mexer com as organizadas.
Elas têm proteção de políticos que travam a mudança da legislação em Brasília.
Impedem, por exemplo, a identificação nos estádios.
Um registro geral dos torcedores.
O princípio é o mesmo usado por motoqueiros.
Eles não querem a obrigatoriedade de identificação nos capacetes.
Assim fogem de multas.
Mas também facilitam a ação de ladrões e assassinos pelas ruas.
Os torcedores não querem ser identificados para poder brigar à vontade.
Cometer a barbaridade que quiserem.
Policiais de todo o país sabem que tudo deve piorar em 2014.
Quando todas as arenas da Copa estiverem liberadas.
Todas sem alambrados.
E com essa legislação frouxa.
É um convite para baderna, invasão de campo, agressão a jogadores.
De vândalos subsidiados pelos próprios clubes endividados.
Situação surreal, vergonhosa.
Digna de um país de Terceiro Mundo que não quer sair da Idade Média.
É mais fácil contabilizar os mortos.
Em 2014, 30 pessoas perderam a vida no Brasil por causa do futebol.
A grande maioria entre membros de organizadas.
Levantamento do Lance! aponta que foram 234 pessoas desde 1988.
Mortes silenciosas que não tiveram qualquer reação das autoridades.
O Brasil continua esperando por um massacre dentro de algum estádio.
Só assim alguém levará a sério o que acontece.
Este é um país em que o campeão brasileiro não pôde comemorar seu título.
Briga de duas organizadas que torcem pelo mesmo Cruzeiro impediram.
Os vexames se acumulam.
Mas os vândalos não precisam se preocupar.
Seus ingressos e viagens estão garantidos.
Os clubes fazem questão de subsidiar.
E quanto às brigas, sem medo.
A legislação frouxa brasileira vai continuar.
Políticos sem vergonha em Brasília garantem.
Que comece logo o futebol de 2014.
Um mês sem cheiro de sangue nas arquibancadas é tempo demais...